Air Fryer

Bom dia!

Uma coisa interessante deste nosso tempo é que está cada vez mais difícil não seguir a manada. É curioso: se antigamente a luta era contra as comidas não saudáveis, gordurosas, e que não acrescentavam nada a nossa saúde, hoje há uma verdadeira cruzada pela Alface.

É curioso como QUALQUER tema social vira conflito ideológico. Pensemos numa coisa que eu reparei nos últimos meses aqui. Todos nós temos em comum algumas características que são especiais, e que realmente geram estes debates meio obscuros, como por exemplo a melhor forma de fazer uma carne na airfryer. Obviamente o tema não é sobre a máquina, que pessoalmente acho até meio inútil, mas sobre a forma que a gente mais “tradicional” lida com o alimento.

Vejamos: todo mundo aqui quer fazer sua comida, preparar suas modinhas, arrumar a marmita no freezer. Creio que todos aqui saibam fazer sua comida, e muitos até matem suas galinhas e porcos pra se arrumar na merenda. Isso é um dado interessante. Pois já passamos daquela fase de comer comida congelada, na BNN isso nunca deu lá muito certo, e isso é legal.

Nos anos 1990 o microondas virou uma ferramenta “comprável” para o bananense médio, e isso criou todo um mercado de comida congelada e semi-pronta. Desde os 1980 já tinha mas era BASTANTE CARO… Issomudou no tempo do Collor, importações, etc… lembro que a gente comprava miojo tailandês no Paes Mendonça. Minha mãe trazia da casa da patroa dela umas comidas engraçadas, que as vezes a gente não podoia comer porque exigia o preparo no microondas. Tosco mas era assim mesmo.

Então essa era até meados dos 2000 foi a da libertação da cozinha. O povo começou a comer desenfreadamente pipoca de microondas (na praça aqui perto de casa pessoal punha uma mesinha com um micrrondas e vendia o saco a 2 reais, um abuso pra época) e lasanha congelada. Finalmente as casas começaram a ter cozinhas menores e com menos espaço pra despensa –

quem aqui tem despensa em casa?

 – e com isso a conformação da casa mudou bem. Começamos a nos emocionar com geladeiras cada vez maiores, com freezers que gelassem mais e mais, veio a febre das duplex ENORMES, colossais pra guardar as toneladas de comidas congeladas que a gente resolvia comprar… Era muito simples, sujavamos pouca louça, era tudo rapidinho. Notem que até hoje a lava-louças não é um equipamento comum, isso é fruto em parte desse salto estrutural aí, dos anos 1990-2000: O microondas matou a lavadora.

Então chegamos nos anos fofinhos dos 2010 e a maluquice fitness virando uma religião agressiva e militante com as moças de collant roxo comprimidos a vácuo se entupindo de saladinhas preparada em potinhos de 40 reais cada, se embebedando com litros de farinha de soja com edulcorante batidos em copões de Ades. Esse povo não come, esse povo não bebe, esse povo é um saco.

E vieram os veganos, aquele povo C H A T O dos infernos, que quer que você tenha culpa de qualquer ovo que frite em casa porque as galinhas são estupradas para lhe dar aquela dúzia de ovos – a “galinha chorou pra botar”, o cara do carro do ovo fala em tom de ameaça e alerta pra você não debater a origem daquele ovo ridiculamente pequeno deles. Esse povo C H A T O que fica reclamando o tempo todo da merda da feijoada enquanto come salada também não tem o costume de comer.

Pensemos que as gerações mais jovens já estão acostumadas à comida congelada e a comidas especiais, e pra piorar e acabar de vez com a utilidade da cozinha, na nossa década gloriosa temos os aplicativos de entrega! SIM, se vivemos em um ambiente selvático, cheio de arborígenes desesperados em nos roubar o tempo todo, aquela fuga básica de comer um podrão no treiler virou uma experiência cara e angustiante.

A gente não vai na rua sem alguma cisma e a chegada dos ifoodes da vida mudou mais uma vez o esquadro. Beleza, eu não quero salada de rúcula com ricota sem sal e humus? não quero aquela lasanha horrenda da Friboi congelada a três anos no freezer? Peço uma comida no celular, nos zapes dos restaurantes, e pronto. Como comida e não faço nada em casa. A cozinha, então, vai virando uma coisa mais incidental, menos essencial.

Os novos apartamentos têm cozinhas exíguas, mínimas. Mal dá pra você abrir a geladeira sem se sentar na pia. Reflexo de uma geração que cada vez menso perde tempo na cozinha. Nosso povo é do tempo em que a Mãe ficava no domingo fazendo comida, pra ter sobra pro começo da semana, aquela carne que tem de demorar na panela, essas coisas. Nós ainda temos o costume de fazer nossa comida, mas até isso é coisa que já está ficando complicado.

Aí, quando a gente debate longamente sobre como fazer que tipo de comidas em qual lugar, é um negócio muito legal. Não estamos ficando burros, não estamos ficando subservientes e acomodados. Dá trabalho fazer coisas boas. Cozinhar é uma arte, e tem muita gente abstrata e modernista, que faz coisas intragáveis. Eu tento fazer direitinho, até porque preciso ensinar meu Menino a fazer também, né?

Em tempo: Ontem fui fazer minha costelinha de porco na aifryer, Môça reclamou, tempero não ficou bom, dei mole. Eu precisava de mais paciência pra preparar o negócio! 😀

Bom dia!