Dosimetria da pancadaria

“O problema aqui são as penas brandas para qualquer crime e progressão de regime. Acho que tinha que ter prisão perpétua para crimes hediondos. Progressão de pena para crimes mais leves mediante a curso de religião, leis e boas maneiras e também trabalhos sociais. Fazer roupas, comidas, serviços gerais para pessoas marginalizadas (idosos, doentes mentais e menores abandonados).

“E eu discordo sobre penas serem baixas demais. Se vc começa a colocar penas altas demais pra qq crime, coisa que já acontece, exemplo, injúria que virou racismo, o cara que vai fazer uma besteirinha, aproveita e faz uma besteirona já que todas as penas são altas mesmos.

“O problema não é as penas por crimes contra animais serem altas, mas sim as penas de crime contra humanos serem baixas.

Bom dia!

Antes de mais nada entendo que todo mundo, de certa forma, está cansado desses discursos sobre violência. Sem dúvida sabemos perfeitamente a raiz dos problemas que nos assolam, e porque tanta gente não tem o menor interesse em resolver estes problemas. Mas faço um comentário, coisa simples, para desambiguar as coisas.

Eu pessoalmente não gosto de direito criminal, criminologia. Mas reconheço a importância fundamental de entender as raízes dessa nossa condição louca e perversa, onde a Justiça perde mais tempo tentando salvar do que buscando punir criminosos. É a realidade do nosso tempo e o nosso sistema judiciário a décadas se viciou em gastar seu poder constitucional para defender o bandido da violência do Estado que sustenta todo o mecanismo de justiça em prol da população.

E esta população sofre com a violência perpetrada pelos criminosos que são libertos e perdoados diariamente pelo Judiciário. Pois a Justiça tem uma visão de mundo e uma opinião bastante diversa da nossa, povo, no que tange aos direitos coletivos e individuais. Seja lá nos EUA onde o “pequeno furto” é liberado em várias cidades, como aqui onde o conceito de “bagatela” é aplicado a favor do cara que rouba um celular de mil reais da diarista no ônibus.

Nossa justiça é “social”. Maldito seja aquele francês desgraçado que inventou a lorota de que o estado é intrinsecamente “mau” e pune excessivamente. Desgraçadamente nosso ordenamento jurídico, que já é horrendamente moroso, burocrático, e cheio de falhas típicas da bizarra mistura de papelada alemã com ideologia francesa, foi transformado em cavalo da loucura social do marxismo moderno europeu, dos anos 1940 e 1950.

E nesse rolo doido de “justiça social” o Direito virou um caldo. Em 1950 era importante evitar penas muito longas em uma europa moída pela Guerra. Muita gente cometeu crimes naquele tempo e era imperativo desarmar os ânimos por toda parte. Não dava pra meter em Nuremberg todo moleque que roubou comida em 1943.

Esse pensamento tem um problema. Ele anula um princípio essencial da Lei. O da efetividade da Lei. Lá atrás o Beccaria, um dos pais do direito moderno, anotava isso daqui, pra ilustrar a situação:

“aquele que perturba a tranquilidade pública e não obedece às leis, isto é, as condições pelas quais os homens se toleram e se defendem reciprocamente, deve ser excluído da sociedade, ou seja, banido”.

Então a Pena servia, antes de mais nada, para tirar da rua o cara que mata, estupra, frauda, rouba, sequestra, descaminha. A função da prisão e da cadeia era essa mesmo. E o Beccaria era de boa, ele entendia que não era bom punir excessivamente. Não adianta punir com rigor absoluto, hamurábico todo crime. Dosimetria era o termo e a ideia de que não valia a pena descarregar todo o aparato da Lei contra o pequeno crime, no entanto mantendo punições que servissem de corretor, educativo viraria regra.

E nos anos 1960 o resultado dessa mudança na forma de se interpretar a Lei começou a dar resultados. Foucault não escrevia criando algo novo, mas antes, ele lia o mundo se movendo intensamente ao seu redor. Outro francês que cagou tudo ainda nos 1950, Bourdieu é a fonte ideológica da “ideologia do roubo”, da ideia de que o crime é algo naturalmente preso à sociedade e que não temos como o impedir, apenas mitigar e adequar nossas realidades ao fenõmeno social.

Essa ideia de que o crime é um fenômeno social envenenou a academia. Um Reale pai não escrevia a toa, um Barrosão não nasceu da urina. A ideia de que o crime é RESULTADO de um fenômeno social lá no pós-guerra até pode estar correta naquele tempo, mas esta tese não deveria ser aplicada universalmente, e exatamente isto acabou acontecendo em nosso ordenamento, assim como no ordeamento ocidental.

Ideias como a de que o crime é naturalmente produzido pelo homem em sociedade, a prisão TEM de restaurar o indivíduo pois o Estado tem de ser saneador das vontades dos homens, ou a de que as penas precisam respeitar o criminoso e seus direitos como cidadão (a ideia mesma de que o cidadão não perde seu status após cometer crimes, o que é bizarro tendo em vista que o crime é exatamente a violação do tal contrato social que temos com o estado através das leis que seguimos!) e que a vítima é natural, inevitável pois o crime é um FATO, não um EVENTO são o que move o judiciário atual.

Não há meio de sair desta situação se hoje o aluno na universidade lê foucault, bourdieu, ou o lucaks, gramsci e os nossos juristas de vitrine. Esse cara vira o juiz que vai liberar o traficante que foi pego com radinho da Firma porque seu crime é de “menor potencial ofensivo”. Vai liberar o cara que matou a ex porque tem bons antecedentes e endereço próprio e a esposa que matou o marido envenenado porque ela “é mulher” e “possivelmente se defendeu de agressões”. Libera o político que rouba porque tirar dez milhões de reais da saúde de um município “não gera risco social”.

Não gasto muito do meu tempo com essas digressões sobre aumento de pena, tal. Brasileiro morre de medo de ser preso pro qualquer coisa aleatória e incerta que venha a ocorrer em dado momento da vida… e por isso defende arduamente penas flexíveis e a volubilidade da justiça. Nossa cultura prefere o ladrão solto e sendo aquele seu amigo do bairro que “resolve os problemas”… Bananense prefere o crime. Só isso.

Bom dia!