Guia de Construção de Imóveis – Parte 1: Comprando o Terreno

Nesta primeira parte do guia, o Muquirana Sideshow Bob detalha os cuidados iniciais que você precisa se ter ao procurar terrenos para construção, além de compartilhar CVRs de suas buscas.

1 – Cuidado com os parentes

A primeira coisa a se pensar é tomar cuidado com os conselhos dos parentes. Afinal, se você está lendo isto é porque provavelmente quer fazer uma decisão racional e calculada. Mas seus parentes, que com certeza estão endividados até o pescoço, vão te incentivar a comprar qualquer porcaria cheia de xoxotecas (para eles usarem inclusive).

“Compra este, tem Pet Place e Praça de Contemplação (!)”, enquanto o terreno é um barranco de 125m2 com fundo para a mata-biqueira.

2 – Tamanho

Um dos maiores arrependimentos que você pode ter no futuro é dispor do dinheiro pra expandir a casa e não ter espaço. Por exemplo, você quer fazer uma churrasqueira ou um cômodo extra, mas é impossível fazer isso num terreno pequeno.

O tamanho será definitivo, igual um apartamento ou casa geminada. Por isso eu sugiro fortemente que leve em consideração terrenos de 350, 500 ou até mesmo 1000 metros quadrados. Espaço não se compra depois.

3 – Plano, aclive e declive

O corretor e seus parentes com certeza vão dizer que não há grande diferença entre comprar um terreno plano ou um acidentado. Pois saiba que há SIM! Você pode não perceber isso no começo, já que terraplanagem não é tão caro, mas você vai gastar MUITO mais com concreto, aço e mão de obra. Facilmente vai-se embora uns 25% a mais na casa pronta! E não adianta deixar o terreno plano, já que num aclive sua casa pode ficar “afundada” entre dois sobrados, e num declive o gasto será alto com muros de arrimo. Se o terreno plano não for ridiculamente mais caro, vale a pena.

Nota 1: não é fácil construir em cima de aterro. O terreno tem que ser muito bem socado e isso não tem custo baixo, além de ter que reforçar o chão com laje-piso ou malhas de aço.

Nota 2: fique atento também a terrenos em zonas baixas e próximas a córregos, devido a enchentes!

Nota 3: eu comprei em aclive e por isso mesmo posso afirmar com propriedade que ficou bem mais caro.

4 – Proximidade de terrenos baldios

Esta dica é importantíssima. Verifique se o terreno não fica próximo de uma área sem construções, como terrenos baldios, matas, barrancos, etc. Nos últimos anos eu vi várias vezes o comprador ser surpreendido (tempos depois da compra) com:

• Prédio construído nos fundos, com 30 apartamentos com vista pro seu ex-quintal.
• Igreja construída do lado, gerando tumulto com barulho, trânsito, estacionamento irregular…
• Obras de expansão de rodovia que deixaram a casa colada com um viaduto ou mesmo com duplicação de faixas.
• O que fazer? O ideal é comprar no MEIO de condomínio, e se for bairro aberto, ficar atento a terrenos nas proximidades e a classificação de zoneamento.

5 – 10km e 50% de desconto

Fiquei mais de um ano procurando terrenos, tanto em bairros abertos quanto em condomínios fechados. Os preços variam MUITO! Estamos falando de terrenos 50% mais baratos a apenas 10km de onde você pretendia comprar. A internet é sua amiga, não tenha pressa e visite dezenas de lugares antes de decidir.

6 – É falso condomínio?

Cuidado com bairros fechados por Associação de Moradores. Procure na internet, existem diversos bairros/loteamentos onde os próprios moradores tiveram a iniciativa de colocar portaria, cerca elétrica, vigilância, etc. A ideia é boa mas infelizmente nesse caso não é possível obrigar todos os moradores a pagarem um “condomínio” – pois este não o é de fato. O pagamento é opcional, logo, alguns bancarão a segurança dos outros. Procure na internet por “falsos condomínios” e verá que é muito comum.

7 – Documentação, condomínio

Acho que isto não precisa ser dito para muquiranas né? TODO CUIDADO É POUCO antes de fechar a compra. Não confie no corretor, pois ele está com pressa de receber a comissão, a ponto de soltar pérolas do tipo “pode pagar, depois se tiver algum problema a gente resolve”.

Ele vai querer também que você pague direto pra ele, mesmo não tendo sido você que o contratou! Até parece, pagar um valor a menos para o proprietário do terreno e depois ficar tentando explicar que foi o corretor que mandou. Deixe o corvo com fome, um passo de cada vez.

Verifique a documentação do terreno no condomínio, na prefeitura, peça para um advogado verificar a situação do vendedor (processos em aberto, arrestos, etc). Peça para o condomínio um demonstrativo da situação do lote, assim você saberá também a saúde financeira do empreendimento.

8 – Casos da Vida Real

Segue alguns CVRs pessoais relacionados a aquisição de terrenos.

CVR 1 – Combinei com um corvo de visitar um terreno numa véspera de natal. Já que ele topou, no horário combinado fomos lá. Olhamos o terreno, era um dos melhores do condomínio, e com o melhor preço. Obviamente numa véspera de natal não teríamos como fechar o negócio, então fomos embora e ficamos de dar a resposta na semana seguinte. Ligamos pro cara na segunda-feira seguinte, ele me solta essa: “ah, sinto muito, falei com o proprietário e ele vendeu no final de semana.”. Ah, claro, – WFT! – Foi o Papai Noel que comprou em pleno Natal? Soltei os cachorros, falei pro cara que ele devia era estar usando fotos de outros anúncios, o cara pediu desculpas e disse que tinha outros terrenos no mesmo condomínio (era chamariz). Mandei pastar.

CVR 2 – Fui em outro condomínio, cujas vendas estavam divididas em duas “fases”. A primeira era mais perto da portaria, tinha mais construções sendo erguidas, era mais próximo da área de lazer, ou seja, estava mais “desenvolvida”. A segunda era no meio do nada, mato alto, quadras e quadras de terrenos encalhados que foram lançados no oba-oba do auge da bolha. O corretor nos leva para ver um terreno na segunda fase, eu já temendo pela minha vida, ainda assim perguntei o preço. Não é que o cara me solta “aqui está um pouco mais caro que na fase 1 pois esta parte está mais valorizada”. Ah, não me aguentei e falei: “mais valorizada o cacete, aqui é pior que a fase 1, só está mais cara porque os compradores pagaram mais caro e agora acham que conseguem repassar o prejuízo”, o corretor arregalou os olhos e não sabia o que dizer. Ofereci 20% a menos que o terreno mais barato da fase 1 e é lógico que o vendedor preferiu continuar com seu bolhudinho encalhado.

CVR 3 – Terreno em loteamento aberto, num bairro super afastado (interior de SP), já praticamente zona rural. Eu já estou procurando um terreno onde Judas perdeu as botas porque eu quero pagar pouco, então liguei no telefone da placa de “vende-se direto com proprietário”. O preço informado: R$ 470.000 (!!!!). Não aguentei e dei risada, pedi desculpa e desliguei. UM ANO DEPOIS, eu passei em frente de novo, a placa estava lá ainda. Pedi para minha esposa ligar, vai que o cara tinha anotado meu número. “Bom dia, estou vendo o terreno tal, quanto você está pedindo?” – A resposta: “Estou pedindo quinhentos”. kkkkkkkkkkk é a valorização do encalhe!

CVR 4 – Condomínio fechado recém inaugurado. No stand de vendas, um mapinha informa que 80% do loteamento já foi vendido, com bolinhas vermelhas indicando que o terreno “já era”. Fomos ver então os terrenos “restantes” e só havia porcaria,  tipo terrenos com declive tão acentuado que ele fazia sombra nele mesmo. Voltamos pro stand e eu falei: “infelizmente não gostei de nenhum que está disponível, se fosse mais plano, mais para o meio do condomínio, eu até cogitaria comprar”. O corvo lamenta então e diz que só aqueles estão disponíveis. Eu começo a me levantar então, o corvo fala: “ah, mas sempre tem desistência né, eu posso fazer algumas ligações, e retorno pro Sr.”. Eu retruquei: “desculpe mas tenho pressa”, e continuei levantando. Não é que o corvo levantou correndo, falou pro outro corvo “ô fulano, não tem este aqui que voltou hoje, olha só”, correu pro mapinha e começou a descolar uma bolinha vermelha, eu não aguentei, continuei indo embora e deixei os corvos grasnando com o lote “recém retornado”.