Um breviário do ENEM

Bom dia!

Hoje acaba a desgraça do ENEM e suas bizarrices intelectuativistas. Eu lembro muito bem de quando isso daí começou a ficar sério, em 2006, quando passou a ser “meio obrigatório”. Eu era professor de pré-vestibular e em uma aula avisei a turma de que – sério, estava na cara – um dia o ENEM seria obrigatório e universal. Não deu outra.

Mas ora essa, qual o problema?

Bem, não há nenhum problema em o ENEM ser obrigatório para o acesso à Universidade. Já experimentamos sistemas vestibulares unificados no passado, e a coisa em si foi um sucesso grande, com universidades públicas e privadas oferecendo as mesmas vagas em um único sistema regional. O Unificado da Cesgranrio no Hell de Janeiro, ou o Fuvestão em SP foram exemplos da eficácia do método.

Sei, OK. Todo mundo achou MESMO que o SISU/PROUNI eram invenções petistas, né? Inocentes, já era pra se ter desconfiado. Pois a lógica de um Unificado como o Fuvestão era a de tentar filtrar ao máximo a entrada de alunos, fazendo com que até as universidades privadas tivessem uma porta de acesso equalizada com a das universidades públicas.

Mas você pode me perguntar… “mas não é injusto criar dificuldades para o cara PAGAR pela Universidade”? Em tese, SIM. Mas o momento era outro, e a ideia de filtragem servia justamente para filtrar o estudante que não estudava, o ativista, e acabava resvalando no pobre que estudava em escolas ruins. E o Estado começou a degradar a qualidade da Escola em um dado momento. Acabou a grana, em linhas gerais.

Some-se a isto a mudança de paradigma dos anos 1980, com a entrada em cena do progressismo na estrutura escolar, com o gradual abandono da metodologia de avaliação de desempenho do aluno, com a entrada na Universidade de professores ideologicamente indexados que relacionavam o interesse do Estado em “excluir” com a noção de “exclusão social deliberada”, uma das fontes das crises estudantis na Europa dos anos 1960 e que buscavam “transformar a educação” via forçar o Estado a agir favoravelmente à universalização do ensino.

Deste pessoal sai a “inovação”, Brizola e os CIEPS, Freire na educação de SP, o Niskier dando pitaco e mais o pessoal da Unicamp com progressismos… Destas ideias saem os artigos da Constituição que versam sobre a “universalidade do ensino”, sobre de como o Estado é OBRIGADO a atender a TODOS os alunos e de como a iniciativa privada é posta em segundo plano dentro deste processo.

Quando a CF é posta em vigor, o pessoal progressista dá o salto e assume de vez as rédeas da Educação a nível formativo. Sintomaticamente um ano antes a UFRJ abandona o Unificado para fazer seu “vestibular isolado”, já buscando fugir da “crescente perda da qualidade do sistema universal de acesso”. As demais universidades federais do Hell até 1991 estavam todas cuidando de seus próprios vestibulares, cada qual tentando manter seus sistemas de filtragem próprios e sustentanto um elevado nível de acesso.

Em sequência, na capital de SP começaram a aparecer movimentos populares ligados à Igreja Católica pedindo “acesso”, e reivindicando o “direito à Educação”. No próximo texto eu faço as correlações entre locais, personagens e queixas, ficaria muito longo explicar isso.