O Vício no Datena

Bom dia, cambada!

Estava lendo esse assunto nos comentários de ontem, de gente que é adicta no datena e sua bizarria diária… e me identifiquei na hora – pois é. Não sei que tipo de morbidez mora em algumas pessoas, as deixando mais tolerantes ao horror do sensacionalismo de violência cotidiano. Sério mesmo, tem aquele pessoal que vê o atropelamento, tem quem vá acender uma vela e tem o cara que quer ver, quer olhar o defunto, mexer no defunto, futucar pra ver a cor do sangue, ver pra quais direções os braçso e pernas estão deslocados, fica conjeturando da familia do cara, dos filhos, mae, pai, netos, o escambau. E depois passa a SEMANA TODA repetindo tudo que viu para os amigos.

E nada disso é recente, todo mundo conhece o Seu Nélson, e naquela peça O Beijo no Asfalto, ele faz um cenário tenebroso de como uma desgraça cotidiana vira o caos para o “cara que gosta de ir lá ver defunto atropleado”. Tivemos toda uma safra de jornais dedicados ao escrutínio dos desastres e mortes de honra e latrocidas, suicidas, estupradores trucidados e apedrejados (fosse engano, a nota seria de semanas…), mães que perdem filhos em enxurradas, incêndios, poços, matas, e Kombis brancas. Todos os dias havia o que postar no jornal, todo dia tinha quem pagasse para receber sua dose diária de dor e sofrimento, com todos os adjetivos toscos que os redatores de um Notícias Populares ou O Dia aprendiam a usar no calor das redações.

Tem um lance que é o da comiseração cristã: O cara PRECISA ver a dor e o sofrimento alheios para poder amaciar o seu próprio sofrimento. Vejo a família desesperada, lacerada de dor pela perda do parente e fico feliz com meu pai cachaceiro, minha mãe babaca e golpista e meus irmãos vagabundos e drogados. Pelo menos estão vivos, e não moídos debaixo de uma 1313 desgovernada num sábado pela manhã. Assim, eu PRECISO sempre receber alguma dose de sofrimento alheio, dor do outro agindo como uma morfina que anestesia nossa propria desgraça. É a mesma lógica de dar dinheiro ao mendigo.

A tecnologia chegou, os jornais acabaram, mas a mídia há muito havia pulado para novos meios de trabalho. Aqui no Hell temos programas que há mais de 50 ANOS fazem a mesma coisa: caçar desgraças, fazer novelinhas com atores pra explicitar e narrar sem nenhuma fidelidade aos fatos todo tipo e desgraças possíveis e imagináveis, para agradar ao pessoal “não sensível”. E o locutor de um dos programas mais toscos deste tipo virou deputado federal, e tudo!

Gil Gomes fez um sucesso absurdo com seu programa de horror vespertino, desse mole podia por o Aqui Agora junto da novela das 8 que ele pegava audiência. E era podre. Um Alborghetti era essa saraivada de revolta e desgraceiras, também, e o povo torcia pela desgraça do ladrão – quer êxtase maior do que ver o criminoso estrebuchando, fresquinho, depois de uma perseguição tipo Dirty Harry de Veraneio? Povo é tipo Roma, precisa de sangue.

Povo curte essa joça, claro. Como dizia o Seu Nélson, “mineiro só é solidário no câncer”… Tem sempre aquela galera que só se anima com a desgraça do outro, e se comisera.

Ah, porque eu me identifiquei com o tema? Simples. Minha mãe é uma dessas figuras aí… !

Bom dia!