Tudo o que é Gratuito

Bom dia.

Esta semana eu até evitei um pouco esse negócio de falar do transplante do cara lá. Bem, todo mundo falou e isso representa uns dez dias a menos para o gobierno ser massacrado publicamente por sua ruindade absoluta. De certa forma é por isso que não deveríamos perder tempo com esses temas, pois são somente diversão, distração.

Mas, vou só alinhar algumas coisas, para que a gente não acabe falando bobagem.

• Pode haver comércio de órgãos?

Bem, obviamente NÃO. No entanto, o sangue também sofre exatamente a mesma vedação, no entanto ele é comercializado SIM, e pior, por uma ESTATAL, a Hemobras. Pensemos que é proibido o comércio de órgãos, mas eu não posso vender meu sangue, correto? ISSO. Você vai doar seu sangue para um hemocentro e receber um lanche, SE HOUVER.

70% do sangue captado vira HEMODERIVADOS. Plasma, plaquetas, plasma vermelho, colágeno humano, plasma de anticorpos, soro neutro, e por aí vai. Na BNN esse trabalho é MONOPÓLIO de uma empresa estatal, a HEMOBRÁS. Esta tem parceria com o Instituto Pasteur francês, que compra a maior parte da produção aqui.

Sangue e hemoderivados são comercializados e exportados. Então a Hemobrás e sua unidade, o hospital N.S. De Nazaré, em POA, pegam sangue do país todo, doado gratuitamente, processam e VENDEM seus derivados no exterior e no mercado interno. Quer dizer, se a rede d’or quiser plaquetas, tem de COMPRAR da Hemobras ou de seus parceiros secundários.

Basicamente a lei permite algumas coisas, ao menos há a brecha legal que permite este comércio de material humano mas o doador precisa estar vivo, né. Este é o limitador de todo tipo de negociação de derivados humanos no mundo civilizado e aqui, também. Assim, não há como se falar em venda de órgãos legalmente.

• Dá pra furar fila?

Olha, em tese não. O sistema sempre foi muito pressionado e sofre muito com a descoordenação de meios e estruturas. Um problema enorme e constante é a perda de órgãos por conta de falhas na articulação dos procedimentos de captação e transplante. Outro problema é a pressão econômica de quem está na fila: hospitais de alto nível mantém lobistas acompanhando as filas para tentar negociar cessões, ou apertar a ponta, a captação nas redes municipal e estadual de saude.

Temos a uns vinte anos um sistema nacional para gestão desse negócio, o SNT. Ele é a “fila geral” em que os sistemas estaduais de transplantes alimentam os dados e monitoram possibilidades de transplante disponiveis. É um sistema tranparente mas, como já sabemos, não é muito eficiente na preservação da privacidade dos seus atendidos.

O que interessa? Interessa saber quem gerencia os dados de entrada de pacientes e quem determina o critério de prioridades naquela fila. Por exemplo, quem identificou que o cara lá precisava de uma cirurgia cardíaca urgente em menos de uma semana? E porque a equipe (o órgão vai para a equipe de cirurgia do paciente) que receberia o órgão tal lá declinou cedendo a vez na fila para o cara lá?

Eu estranho exatamente os pontos subjetivos do negócio. Aquele pedacinho onde a “intervenção humana” é essencial. Quero dizer: pode haver interferência direta em várias etapas de qualquer processo deste tipo. E pode ser que alguém faça isto. Não estou desconfiando de nada mas se é pra confiar 100% no SUS “público, gratuito e de qualidade”… aí já complica…

Bom dia!