Chinês que preparava série para a Netflix sobre líder comunista morre envenenado

A meu ver, o que está acontecendo é que estamos assistindo o fim do modelo da democracia liberal. As nações por diversos caminhos estão se reordenando para uma nova ordem política não liberal.

Diferente do que as diversas correntes ideológicas da modernidade afirmam, o Estado e a vida social surgem naturalmente com o ser humano, ou seja, de forma orgânica. Não é fruto dessas abstrações ideológicas de contrato social ou qualquer coisa do tipo.

Todo ser humano nasce e cresce numa família, nenhum ser humano nasce no nada, isolado, mas uma família é incapaz de produzir tudo o que é necessário à sua subsistência, daí que as famílias se relacionam e se unem para que por meio dos trabalhos de cada uma possam conseguir tudo aquilo de que necessitam para sua subsistência. Assim surgem, algo como que associações de trabalhadores, entidades de classe, clãs de pastores, agricultores, associações de mercadores, etc…

Mas para que todas essas organizações possam conviver harmonicamente, se faz necessário uma entidade que as ordene mediando seus conflitos. E assim, orgânica e naturalmente surge o estado.

Então, entre o estado e a pessoa humana existe a família e essas associações de famílias. Essas entidades são chamadas de corpos intermediários. Na ordem social anterior a modernidade (inaugurada a partir das revoluções liberais) a sociedade se estruturava dessa forma.

Entre o estado e a pessoa haviam vários corpos intermediários que surgiram organicamente e que retiravam o poder do estado. As pessoas não estavam isoladas, mas congregadas por meio das famílias nesses diversos corpos intermediários como: Corporações de Ofício, Associações de Mercadores, os Fueros, as Municipalidades e suas Câmaras Municipais, Cabildos, as confrarias religiosas, paróquias, associações de moradores, Guildas, Milícias particulares, estados gerais, cortes, etc.

Toda essa estrutura de corpos intermediários retirava poder do estado e entregava as pessoas por meio de todas essas entidades. Daí que o estado, na figura do monarca agia apenas como um mediador dos conflitos, o seu poder era brecado em baixo por esses corpos e em cima, pela autoridade da Igreja que seguia a doutrina das duas espadas explicada muito bem por Bonifácio VIII na Unam Sanctam.

Para fixarmos um momento histórico e não gerar mimimis (pois essas revoluções liberais nada mais são que o segundo estágio de uma revolução anterior), podemos olhar a desconstrução dessa ordem social tomando como ponto de partida as revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII:

As revoluções liberais destruíram essa estrutura de corpos intermediários, seja por meio da assimilação de concepções políticas ideológicas que remodelarão as municipalidades com critérios ideológicos (veja, por exemplo a redefinição política da França em departamentos após a revolução francesa). Então toda aquela rede diversa de fueros, municipalidades, cabildos, etc com suas peculiaridades e autonominas desaparecem com a imposição de uma uniformização baseada cada vez mais em critérios impessoais e “técnicos” (ideológicos). Podemos citar também nesse processo a substituição das milícias particulares pelo somem com a ascensão do exército moderno cada vez mais “profissional” e impessoal (no sentido webberiano), no âmbito interno da Igreja as confrarias religiosas substituídas pelas pastorais baseadas cada vez mais em critérios técnicos, a burocratização crescente com comissões nacionais de bispos, etc. Todo esse processo vai levando a um crescente aumento do poder do estado e diminuição de poder dos corpos intermediários.

Esse isolamento crescente das pessoas é reforçado pelo advento do capitalismo e revolução industrial que vai isolando cada vez mais as pessoas inclusive em suas famílias com jornadas de trabalho enormes, ataques cada vez maior a família pelo desejo de lucro crescente que vai cada vez mais vai rompendo os valores sociais. Assim, com as pessoas isoladas cria-se uma massa amorfa de pessoas que ficam sem condições de fazer frente ao poderio crescente do estado moderno (pois estão isoladas diante dessa estrutura enorme) e essa massa fica cada vez mais a mercê dos desvarios ideológicos.

A Revolução liberal vai tentar reagrupar essa massa justamente nos partidos políticos. Os partidos políticos serão a tentativa liberal de refazer os corpos intermediários. Ao mesmo tempo, surge a reação socialista e suas variantes que tentará organizar esses corpos intermediários no estado. Temos o exemplo disso nos sovietes soviéticos, nas comunas e equivalentes, na usurpação da idéia de sindicato (que surge, esse sim, organicamente por pessoas que desejavam melhores condições de trabalho), nos seus partidos políticos de regime único, etc. No fascismo isso é muito claro com a máxima “tudo no estado, nada fora do estado”. Tudo aquilo que restava de corpos intermediários orgânicos no fascismo vai se buscar por dentro do estado. Daí que o fascismo para muitos, desperte uma idéia de ser anti-revolucionário e elementos para-fascistas terem se associado, a elementos tradicionalistas anti-liberais e socialistas na Guerra Civil Espanhola, por exemplo.

Ao final da 2ª Guerra o modelo liberal se consolida no Ocidente e, então, os partidos políticos vão figurar claramente como esses corpos intermediários da ordem liberal, daí que eles assumem protagonismo nessa ordem. Nesse momento o secularismo já vitorioso acaba com as últimas limitações acima ao Estado vindo pela Igreja.

Com o colapso do bloco socialista, o modelo da democracia liberal entra naqueles países.

Mas por n fatores os partidos políticos não estão mais cumprindo o seu papel de corpos intermediários porque não atendem mais aos anseios das pessoas, fruto de uma ideologização cada vez mais crescente e que é consequência natural dos princípios sob os quais a modernidade foi erigida.

Então, temos que na América do Norte e Europa a democracia liberal está convergindo para uma ordem não liberal que é a tirania globalista-marcusiana, na Rússia o experimento de democracia liberal dos anos 90 já foi abortado com Putin, a China está no seu regime socialista, o mundo islâmico ainda está no antigo regime de sua civilização e na América Latina estamos caminhando para a tirania globalista-marcusiana.

O caso de exceção que vejo é a Hungria que está com sua democracia iliberal e que já decretou nas palavras de Orbán “o fim da democracia liberal no país por não ter conseguido garantir as liberdades individuais dos cidadãos”.